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Foto do escritorPatrícia Claudine Hoffmann

Livro "Entre os Lábios do Avesso" (ed. Patuá - 2003), de Sandra Boveto 📚❤️

Tão boa a companhia do livro "Entre os Lábios do Avesso", ( Editora Patuá - 2023 ), da querida Sandra Boveto ... que ameniza-nos de mundo.


O livro é um universo de poemas que nos transporta por dentro e por fora das órbitas que compõem o tempo e seus viajores, todos com seus respectivos avessos.


Sua poética nos suspende num pêndulo giratório de visões na viagem, com a magnificência que só a aptdão da verdadeira beleza pode alcançar,

pelas cordas siderais de uma delicadeza profunda, sensória, numa elevação que nos flana entre as milhares de pontas das palavras, interagindo-nos de múltiplas sensações habitantes lá das outras bandas da alma ....entre os "multiversos" de ser.


Poética que revira o verbo no fundo de nossas constelações, onde cada poema toca, expande e explode em supernovas portadoras do melhor avesso que há em tudo, em todos/as, sem revelar-nos de qual lado ele fica ou em qual dos lábios do coração de nossa leitura, ele desponta. E cria outros.

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Obrigada, Sandra Boveto, por tanta beleza!!! Bjo. ❤️📚🌬🌏✨️


*

SINGULARIDADE


transito entre arranha-céus

cravados nas têmporas

da nuvem

um temporal ruge

e se avizinha

meu tempo insistente caminha

escalo o transe das paredes lisas

vidros fumês atemporais

refletem cinzas

deslizo acima

não há anjo final na esquina

nem há fôlego

pelo imã cinzento despenco

e perfuro

a cama elástica do espaço-tempo

presa da insana gravidade

talvez escape

pinçada pela singularidade


(p. 85)

*

ECLIPSE DA REALIDADE


quero a dimensão improvável

em que a lua e o sol

negam-se ao sono dos comuns

e procuram-se

desviam seu curso universal

unindo versos

no reverso do esperado

quero a dimensão do infinito

guardada no que não é eterno

dispenso a eternidade

que em legítima defesa

rejeita a intensidade

do que desejo


(p. 32)


*


NÃO ABRA A CAIXA


onde está a realidade?

não, ela não está aqui

lacrada nesta caixa

sou o tal gato vivo-morto

superposição quântica

velada

indefinida

estou morta

e estou viva

ao observador sou tudo

e nada

não abra a caixa

o tempo?

ora, o tempo

não o tenho aqui

agora

também não está lá fora

não o entendo

ele fixa

mas não é fixo

contínuo, é peremptório

muda e registra

faz muda e mata

é branco e marca

mancha e limpa

sua marcha é limpa

ainda assim, a nódoa fica

não, não abra a caixa

cicatrizes?

invencíveis

as piores se mostram e revelam

o que só a morte cessa

depois dele

do tempo

depois de muito dele

vejo que não é o tempo

mas os vermes

que apagam as cicatrizes

iguarias

que o tempo serve aos vermes

elas vivem além de você

eles não sobrevivem ao tempo

sim, os vermes

o tempo os devora

com seus estigmas corroídos

não abra a caixa

engane-se por um tempo

não faz mal

ao tempo mal nenhum se faz


(p. 19, 20 e 21)

*


RASA É A RAZÃO QUE SE ARRASTA


esperam-me pouca

no oco da voz

na casca da noz

sou parca e tosca

fosco é o espaço

turvo e quadrado

gira ao desgaste

e engata-se

na órbita crucis

esperem-me cíclica

à morte das horas

...

pandoro-me aquém

do fundo da caixa

- procuro o fundo

em todas as caixas

rasa é a razão que se arrasta

basta-me e vem

lança do tempo

me alcança

transpassa

não há fundo

e não afundo na caixa

...

descanso em descaso

no casco do touro

ao agouro

de um tempo sanguíneo


(p. 75 e 76)



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