Ao avistarmos o livro “O Sol e o Peixe”, coletânea de prosas poéticas da escritora britânica Virginia Woolf (1882–1941), publicada pela editora Autêntica (2015), nossos olhos são, assim de imediato, tarrafeados por uma sobrecapa-poema, um aquário gráfico-visual belíssimo, de Diogo Droshi, sobrecapa esta, que é então a porta de entrada para a leitura e nos convoca a adentrar nesse universo hipnotizador de beleza, que Virginia nos traz pela palavra, pelo coração da palavra, melhor dizendo.
Com seleção, apresentação e tradução de Tomaz Tadeu, o livro traz à tona nove dos ensaios de Virginia, os quais, em seu total, originalmente, encontram-se compilados em seis volumes, somando cerca de três mil páginas. Desses textos, o tradutor selecionou aqueles com tom mais fortemente lírico, poético… “São alguns desses ensaios que procurei reunir nesta pequena coletânea. Eles têm, em geral, um tom lírico, poético, experimental…”, nos diz o tradutor em sua apresentação.
Os textos estão organizados em três capítulos: “A vida e a arte”, “A rua e a casa” e “O olho e a mente”. Nessa viagem-pesca, tudo segue a nos capturar num ambiente em que somos deliciosamente fisgados por inúmeros aspectos, desde a fascinante linguagem de Virginia, que nos escolta às questões da condição humana, até os fluxos de consciência ou a fluidez criativa, através dos quais a autora capta tão bem a alma das coisas e dos seres.
Não há um só território no livro que não seja de enredamento com a beleza, que não seja conexão com o inefável; com o sublime a nos contorcer de euforia por causa da ponte que gera com uma espécie de cotidiano e que, por sua vez, nos leva ao sagrado, ao mais alto grau de percepção do mundo e de tudo o que no mundo é ou pode ser sentido.
Logo nas primeiras páginas já “não somos mais o que somos”. No ensaio que abre a coletânea, sobre Montaigne, a escritora joga seu anzol e dispara que “A beleza está por toda parte, e a beleza está a apenas dois dedos de distância da bondade.” E diz mais, para que “Deixemo-nos fervilhar sobre nosso incalculável caldeirão, nossa enfeitiçadora confusão, nossa miscelânea de impulsos, nosso perpétuo milagre — pois a alma vomita maravilhas a cada segundo.”
Ao prosseguir em sua pescaria existencialista, Virginia discorre nos textos seguintes, sobre seu pai, sobre a paixão acerca da leitura, entre outros. E nos fisga mais uma vez de encantamento no ensaio “Flanando sobre Londres”, texto pelo qual nos faz mergulhar sem escapatória poética, numa jornada que começa com a decisão de sair para comprar um lápis, e de repente, entramos madrugada adentro… a nos debater nas águas de sua mais profunda e ampla observação, onde cada detalhe descritivo nos faz “escutar o leve crepitar e estalejar das folhas e dos gravetos que parece supor o silêncio dos campos em volta, uma coruja piando e, ao longe, o chocalhar de um trem no vale. Mas isto é Londres, somos lembrados; no alto, entre as árvores nuas, pendem molduras retangulares de luz amarelo-avermelhada — janelas;”
E o que nos resta? Além de toda a poesia-isca espalhada por todo o aquário escrito? “o que resta é uma ostra central de perceptividade, um enorme olho.” O que nos resta é o eclipse entre a prosa mais fluida e o universo. Sem dó de sermos fisgados pela eternidade. E aqui bem-somos!: “Aquários recortados na uniforme escuridão encerram regiões de imortalidade, mundos de luz solar constante onde não há chuva nem nuvens.
Seus habitantes fazem, sem parar, evoluções cuja complexidade, por não ter nenhuma razão, parece ainda mais sublime. Exércitos azuis e prateados, mantendo uma distância perfeita apesar de serem rápidos como flecha, disparam primeiro para um lado, depois para o outro.”
Um livro que dialoga com a alma e que … “se torna o melhor amigo que temos no mundo.”
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Obrigada à escritora, pesquisadora, jornalista e editora Katherine Funke, pelo convite e ao Coletivo Virgínia.
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O texto foi produzido especialmente para o zine #4 do Coletivo Virginia, uma edição com resenhas de livros da Virginia Woolf, abordados por participantes da #SemanaVirginia. Patrícia Claudine Hoffmann, autora da resenha, integrante da mesa “O Sol e o Peixe: a prosa poética em voga”, que aconteceu no dia 19/10, às 14h, no Sesc de Joinville. O zine foi lançado um dia antes, na noite do dia 18, chamada O Valor do Riso, no Gajah Hostel.
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Graduada em Letras pela Univille, Patrícia tornou-se professora efetiva da Rede Estadual de SC, onde leciona Língua Portuguesa e Literatura. É autora dos livros de poesia “Água Confessa”, “Sete Silêncios”, “Matadouro Imperfeito”, “Feito Vértebras de Colibris” e do e-book “O Livro de Isólithus”. Mantém o blog www.patriciaclaudinehoffmann.com, e a fanpage “Patrícia Claudine Hoffmann - Poeta". Integra antologias e tem poemas publicados em revistas digitais.
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Coletivo Virginia é um coletivo feminista, atuante em Joinville (SC), que objetiva difundir a literatura de autoria feminina, promovendo ações de produção, leitura e circulação.
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